Considerações sobre a probabilidade de surgimento de um novo gene

(Texto extraído de Heitler, W., Naturphilosophische Streifzüge, F. Vieweg und Sohn, Braunschweig, 1970; transcrito para o português por Karl Heinz Kienitz.)

Não sabemos qual a exata disposição de nucleotídeos num organismo. Mas é fácil indicar um limite superior para a probabilidade de certa redisposição. Sabemos o seguinte: No código da molécula de DNA um gene corresponde a um comprimento de algumas centenas a alguns milhares de nucleotídeos. Para um gene intacto há pouca liberdade na disposição dos nucleotídeos. Às vezes, a substituição de um só nucleotídeo por outro "incorreto" pode causar perturbações consideráveis no organismo. Trata-se do "gene químico", entendido como morfologicamente eficaz.

Para que apareça uma macromutação favorável, certamente é uma subestimativa bem grosseira supormos que pelo menos um gene deve ser reconstruído ou redisposto. Ainda exagerando na subestimativa, suponhamos que uma disposição bem definida (ou redisposição) de 100 nucleotídeos é necessária, para provocar uma macromutação. Do ponto de vista físico não há razão para preferir uma disposição a outra. As forças físico-químicas agem apenas sobre a vizinhança. Dado que por experiência praticamente todo nucleotídeo pode ser vizinho de qualquer outro, então também praticamente todas as disposições são fisicamente possíveis e, de antemão, igualmente prováveis. Em aberto permanece apenas a pergunta do número de disposições biologicamente equivalentes.

Não sabemos algo definido sobre isto. O fato de que um único nucleotídeo substituído já pode causar perturbações consideráveis indica que com certeza não podem ser muitas. Isto também se depreende do fato de que, na natureza, há inúmeros genes (em bactérias, rãs, macacos, homens, não só em cada organismo específico) que diferem apenas pela sua disposição de nucleotídeos.

Suponhamos, pois, que apenas uma disposição num só gene constituído de apenas 100 nucleotídeos, 25 de cada tipo, leva à macromutação. Então, o número de disposições é 100!/(25! x 25! x 25! x 25!) = 1060, um número com 60 zeros [1]! A probabilidade de encontrar aleatoriamente "aquela disposição correta" é portanto 1 : 1060. Para um gene com 200 nucleotídeos a relação já seria 1 : 10120. E, contudo, em quase todos os sentidos, este número é uma superestimativa desmedida da probabilidade. Se tivéssemos considerado o comprimento inteiro da molécula de DNA ao invés de um gene, o número de disposições de nucleotídeos seria um número com milhares à milhões de zeros!

Se quisessemos supor que os 3 nucleotídeos formando uma "palavra" já estão ligados firmemente por quaisquer razões físicas, de modo que apenas a disposição das "palavras" (e por conseguinte dos aminoácidos na proteína) são deixados ao acaso, então nada de essencial é alterado. Seja um gene formado por 60 palavras (180 nucleotídeos) e estejam disponíveis sempre 3 das 20 possíveis "palavras". Então, a probabilidade de certa disposição das palavras é 1 : 1065.

Mas é possível que entre estas muitas disposições também haja algumas que correspondem a um organismo viável. (Continuamos com a consideração do DNA como único fator determinante.) Este poderia corresponder por exemplo a uma forma intermediária entre réptil e ave, que seria inicialmente estabilizada pela seleção. Isto não altera a sistemática de cálculo. Ao ignorarmos as formas intermediárias, consideramos a seleção na medida em que associamos a estas formas um tempo de sobrevivência nulo, ou seja, subestimamos o tempo de desenvolvimento. De qualquer maneira, ao final terá surgido o gene do pássaro.

O que o número 1060 significa para a possibilidade de um redisposição favorável pode ser ilustrado do seguinte modo: Suponhamos que num organismo a disposição dos nucleotídeos se altera constantemente para formar um novo gene. Adicionalmente suponhamos que a duração necessária para um redisposição é 10-12 segundos. Isto é demasiado curto; processos atômicos requerem muito mais tempo e processos moleculares mais ainda. Suponhamos também que existe uma população com 1015 indivíduos (1000 trilhões) do tal organismo. (A humanidade atual compõe-se de 4 bilhões de indivíduos). Então o tempo esperado para o surgimento do novo gene em algum dos indivíduos é 1033 segundos = 3 x 1025 anos. O universo inteiro existe há certamente não mais de 1012 anos. Assim o universo precisaria reviver sua história atual 10 trilhões de vezes até que o novo gene surgisse uma única vez num único indivíduo! É naturalmente um completo absurdo. Para evitar estes números catastróficos para a hipótese do acaso, alguns biólogos falam de um "direcionamento útil" na construção de tais cadeias de nucleotídeos. Com isto deixa-se o terreno da física - que não conhece "direcionamento útil" - e introduz-se uma lei biológica específica. Apontar a necessidade de algo assim é precisamente o objetivo das nossas considerações. Neste caso, então, todas as considerações de probabilidade tornam-se ilusórias porque não sabemos mais o que deve-se à lei e o que deve-se ao acaso; a noção de probabilidade aplica-se somente a eventos randômicos.


[1] O número exato é 1,6122 x 1057.